Sporting Kansas City, da liga norte-americana, investe em tecnologia para o torcedor, com celular na mão, virar parte do espetáculo
Seu time é líder do campeonato e jogará em seu caldeirão contra uma equipe que vem complicando jogos para os adversários. Ingressos comprados há meses, você sai do centro da cidade e em 15 minutos estaciona o carro em frente ao estádio. Como faz frio, muita gente veste jaquetas e cachecóis com as cores do time. Achar seu lugar é fácil e a atmosfera é eletrizante: a acústica do estádio amplifica o barulho da torcida, e há tempo para aproveitar a rede wi-fi gratuita de alta velocidade para conferir a escalação, fazer comentários no blog da equipe, acompanhar o que os jogadores postaram nas redes sociais e enviar mensagens de incentivo pelo Twitter. Mensagens que, em instantes, aparecem no telão.
Esse cenário pode parecer utopia para o torcedor brasileiro, mas é realidade em Kansas City, no meio-oeste dos Estados Unidos. Num país em que o futebol está longe de ser campeão de bilheteria, o Sporting Kansas City se destaca dentro e fora das quatro linhas. O atual líder da Conferência Leste da MLS (Major League Soccer) esgotou os ingressos de seus últimos 31 jogos em casa e é um sucesso no relacionamento com a torcida. Essa história, porém, era muito diferente há bem pouco tempo.
Em 2006, quando Robb Heineman, veterano do mercado financeiro especializado em investimentos em internet, se tornou CEO do Sporting Kansas City (então Kansas City Wizards), a equipe tinha a pior média de público da Major League Soccer (MLS), o campeonato local: menos de 10 000 pessoas. Deprimente para quem tinha de utilizar o estádio do time de futebol americano Chiefs, com 77 000 lugares. Sete anos depois, o time conta com um estádio próprio (19 000 torcedores), vendeu todos os camarotes para a temporada e tem lista de espera por ingressos. Sua arena e os investimentos para transformar a experiência de “consumir futebol” fizeram do Sporting Kansas City uma das empresas mais inovadoras do esporte americano.
Inaugurado em junho de 2011 a um custo de 200 milhões de dólares, o Sporting Park nasceu para ser uma arena de eventos dos mais variados tipos. O estádio pode ser adaptado para shows, com 25 000 pessoas sentadas, e já recebeu artistas como Willie Nelson e Dave Matthews. O complexo esportivo, que também conta com os escritórios da Cerner Corporation, empresa de tecnologia especializada em saúde que é acionista do clube, está localizado ao lado do autódromo Kansas Motor Speedway e de um grande shopping center, atraindo cerca de 2,5 milhões de visitantes por ano, número semelhante aos do Arrowhead Stadium (sede do Kansas City Chiefs, de futebol americano) e do Kaufman Stadium (Kansas City Royals, de beisebol) juntos.
No estádio, uma rede de internet wi-fi de alta velocidade oferece ao torcedor a possibilidade de ter uma experiência mais interativa e personalizada usando tablets e smartphones. “Desde o início da construção do estádio, tivemos reuniões semanais com a equipe responsável pelo projeto para desenvolver uma experiência inesquecível para os torcedores, não apenas dentro do estádio, mas também considerando a chegada e a saída”, comenta Rob Thomson, vice-presidente executivo de comunicações do clube.
O uso de tecnologia para oferecer vídeos em alta definição para usuários de tablets e o desenvolvimento de aplicativos que permitem utilizar os celulares como ingresso se tornaram referência em estádios no país. Mais de 320 telas de TV estão espalhadas pelo Sporting Park e possibilitam que os torcedores não percam um lance, mesmo ao comprar uma cerveja ou ir ao banheiro.
BOLA NA REDE
O time é um exemplo de bom uso das redes sociais. Quem envia mensagens pelo Twitter para o perfil do clube (@sportingkc), por exemplo, tem seus posts apresentados no telão. “Esse recurso, sozinho, aumentou em 20% o número de mensagens enviadas para nós”, afirma Thomson. Todos os jogadores têm perfil no microblog e a direção do time fala com a torcida pelas redes sociais diariamente, apresentando notícias e pedindo opiniões. O site www.sportingkc.com tem um blog com podcasts sobre as partidas, vídeos e entrevistas com os jogadores. “Estamos presentes em 59 canais de contato online, entre perfis no Twitter, YouTube, Facebook, Instagram, Storify, Google+, blogs, podcasts e outros”, diz Rob Thomson. Sua presença digital é segmentada entre time principal, categorias de base, eventos, dia de jogo e produtos, criando diversas oportunidades de relacionamento com os fãs.
Com aplicativos para smartphones, o clube ganhou subsídios para conhecer melhor os hábitos de seus torcedores. As primeiras versões dos aplicativos apresentavam jogos de perguntas e respostas e permitiram criar um enorme banco de dados de preferências e oportunidades de consumo. As possibilidades são infinitas: o elogio de um fã a uma defesa do goleiro pode levar à oferta de ingressos para uma sessão de autógrafos com o camisa 1, por exemplo. “Nos últimos anos, passamos do último lugar para a terceira posição em venda de produtos. Somos também o clube com maior índice de renovação dos carnês de ingressos para a temporada”, afirma o executivo.
Cerca de 25% do tráfego da rede de dados do estádio nos dias de jogos decorre do aplicativo do time, que, na versão mais moderna, conta com estatísticas em tempo real e live streaming (transmissão ao vivo pela internet) das partidas em sete ângulos diferentes. Ver na hora o replay daquele pênalti polêmico alia o melhor de dois mundos — o conforto de casa e a agitação do estádio.
A estrutura desenvolvida pelos donos do Sporting Park chamou a atenção de toda a comunidade esportiva americana. Mais de 200 clubes, das mais variadas modalidades, enviaram executivos para visitar o estádio. Os donos do time criaram uma empresa, a Sporting Innovations, para desenvolver plataformas que usam as tecnologias para celulares, aliadas a bancos de dados, e geram conhecimento sobre os torcedores e novas possibilidades de faturamento.
Segundo a empresa, oito dos 20 maiores clubes americanos de vários esportes já fecharam acordos para desenvolver aplicativos e equipar os estádios com a infraestrutura de conectividade necessária para permitir que os torcedores interajam com seus amigos e com os times durante as partidas. Uma dessas empresas é o Utah Jazz, da NBA, que pelos próximos cinco anos usará a tecnologia da Sporting Innovations para captar informações sobre seus torcedores. “A parceria fará com que fiquemos mais próximos de nossa torcida, facilitando o contato dela com os jogadores e com a direção do time”, comenta Craig Sanders, vice-presidente sênior de marketing do Utah Jazz. A plataforma tecnológica permite, por exemplo, acompanhar quem retuíta uma foto a partir de um celular com o aplicativo do time. Ao identificar essas pessoas como potenciais compradoras de produtos e serviços ligados àquela marca, o sistema cria novas oportunidades de negócios e amplia as possibilidades de receita.
O próprio Sporting Kansas City, onde tudo começou, é um caso de sucesso. O faturamento crescente com artigos esportivos, a grande procura por ingressos e o desempenho dentro das quatro linhas (o time tem lugar cativo nos playofs da MLS) mostram que o investimento em tecnologia para atrair e fidelizar os torcedores gera retorno e aponta um caminho que mais e mais times seguirão: pensar além das quatro linhas para oferecer uma experiência inesquecível aos seus clientes. O torcedor é o rei.
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